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Silenciamento negro nas relações de amizade

  • Laís Monteiro
  • 29 de ago. de 2017
  • 3 min de leitura

Um dia desses em um dos meus momentos de consumo de conteúdos sobre negritude, ouvi uma frase dita por uma ativista negra chamada Monique Evelle que frisava: “Eu nunca fui tímida, eu fui silenciada”. Essa frase me gerou uma reflexão enorme sobre minha vida e me fez chegar ao momento de escrever esse texto.

Eu sempre fui uma pessoa extremamente tímida, para expor algo que eu pensava eu tinha que pensar muito sobre o assunto e ter certeza que a minha fala iria produzir algum efeito positivo nas pessoas. Porém, entre meus amigos íntimos sou a boba, que coloca apelidos em todo mundo, que fala merda, que fala pra caramba e sempre tem uma história para contar.

Depois que ouvi a frase da Monique, fiquei refletindo até que ponto eu era tímida e até que ponto eu era silenciada. Sim, existe muita diferença entre os dois termos.

O silenciamento sempre foi uma situação presente na minha vida, talvez porque desde a infância eu tenha vivido sem o identificar, pois já era algo tão natural que fui me adaptando. E foi assim, eu sempre observei muito todos os ambientes antes de expor algo, eu tinha que me adaptar, eu tinha que estar dez vezes mais arrumada, eu tinha que ter muita certeza do que ia falar pois sendo mulher e negra a minha fala tinha que ser sempre mais relevante para ser realmente considerada.

Estou levantando esse fato por notar que não sou um caso isolado, recebo diversas histórias de mulheres negras que passam pela mesma situação e já identificaram o silenciamento, como também as que e não tem ideia que estão sendo silenciadas. Percebo que sempre há retorno e identificação de outras com a história quanto os assuntos que abordo na teoria, mas há ainda mais quando conto como essa teoria afeta minha realidade.

Eu aprendi com a vida a “calar caso não tenha certeza”, “não me expor”, “não fazer pergunta idiota”, e então silenciei ou me silenciaram?

Eu queria estar nos locais, mas estar invisível, para não correr o risco de alguém me perguntar algo e eu falar besteira. E quando não tinha como fugir e eu tinha que responder algo, ficava remoendo minha resposta o dia inteiro, pensando que poderia ter falado melhor. Eu sempre me cobrei muito, eu tinha que ser melhor, porque eu sou negra.

Meu objetivo com esse texto não é trazer analises profundas sobre silenciamento, mas falar sobre o assunto, porque é algo que afeta a vida de muitos negros. Primeiro não só porque você pode ser uma pessoa que está sendo silenciada, mas também uma pessoa que pode estar contribuindo para o silenciamento de alguém. E olha, silenciar não é discordar de um ponto de vista, mas impedir, ou não dar importância ao que essa pessoa tem a dizer. Descobrir esse fato, foi libertador para mim.

Então vem cá, vamos bater um papo, vou lhe fazer umas perguntas e você analisa ai... Você já desconversou quando um amigo negro tentou falar sobre racismo? Você já disse que isso não existe ou que as coisas não são desse jeito? Você já tentou falar sobre um assunto no lugar dele que vive na pele? Você já tentou decidir por ele o que é racismo ou não? Mas o mais importante, você já experimentou dar a fala ao seu amigo? Já parou para ouvir a história de vida dele? Tudo que ele passou ou passa para ser quem é? Essas perguntas são determinantes para identificar silenciamento não só sobre questões raciais, mas também sobre posicionamentos.

A todo momento escuto pessoas afirmando não serem preconceituosas, que tem vários amigos negros, mas se falar de preconceito se isenta, acha que é vitimismo, acha que falar de igualdade racial é desnecessário e que isso não vai trazer benefício algum. A todo momento vejo gente apoiando campanhas e pessoas do outro lado do mundo, não que não deva apoiar, mas SILENCIAR um amigo e dar voz a um desconhecido é prova da desumanização das relações, do carinho pelo próximo. É prova que entramos no piloto automático e esquecemos do real sentido de amizade, do amor e da vida.

Pra hoje, quero deixar um pedido, tire um tempo, escute o que seu amigo negro tem a dizer, dê o seu direito de fala, seja na mesa do bar, tomando um café ou no momento que achar oportuno. O silenciamento não é algo distante, o preconceito não é algo distante, está aqui perto, e infelizmente é uma “condenação” que todo negro já herda ao nascer. Finalizo com uma frase da Alice Walker: “Não pode ser seu amigo quem exige seu silêncio”.


 
 
 

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